terça-feira, 9 de abril de 2013

Crítica: "Paper Macbeth" de volta

Teatro. Espetáculo premiado está na programação da Maratona Cultural de Florianópolis

DIRCE WALTRICK DO AMARANTE
dwa@matrix.com.br

A peça "Paper Macebth", vencedora do Cultura Inglesa Festival, em 2013, reestreia na cidade no dia 24 de março. Trata-se de uma adaptação de "Macbeth", de William Shakespeare, concebida por Sassá Moretti e Aline Maciel para teatro de bonecos, de objetos e sombras. A peça agora integra a 3º Maratona Cultural de Florianópolis, que ocorre de 22 a 24 de março.

Quem assina a direção do espetáculo é Sassá Moretti, que além de possuir uma longa experiência com teatro de bonecos, é também idealizadora e coordenadora do Festival Internacional de Teatro de Animação (FITAFloripa), que acontece desde 2007 em Florianópolis e em outras cidades do estado.

Em "Paper Macbeth" (Macbeth de papel), como o próprio título sugere, os personagens e parte do cenário são feitos de papel. O papel por isso tem uma importância simbólica fundamental nesta montagem. Em "O papel ou eu, os senhores sabem...", o filósofo francês Jacques Derrida afirma que "o papel é um corpo-sujeito ou um corpo-substância, uma imóvel e impassível superfície subjacente aos traços que viriam afetá-la de fora, [...]".

Poder-se-ia dizer que o papel, em "Paper Macbeth", representa de certa forma o caráter de Macbeth, um personagem cujos "traços de fora" - as previsões das bruxas e os conselhos de sua mulher - lhe dão vida, o incitam e o afetam. Já os atores-manipuladores desta adaptação shakespereana seriam aqueles que, mesmo estando "fora" da cena, animam/afetam o papel.

Quanto aos mensageiros e às bruxas, o papel aludiria, nesta ousada montagem, aos "poderes de um porta-voz", como diz Jacques Derrida. Há que se recordar ainda que o papel, antes de ser - ou deixando de ser - o "suporte da escrita" se presta a qualquer outro uso, exatamente como acontece em "Paper Macbeth", que usa o papel não só para a confecção de bonecos, mas também para representar diferentes mídias (televisão, rádio, jornal)

As múltiplas mídias de que a adaptação de Sassá e Aline se vale traduziriam a velocidade rítmica original de Macbeth, que, como afirmam os críticos, segue uma cadência acelerada. As mídias também representariam as bruxas - "As Estranhas Irmãs Bruxas do Destino, de mãos dadas, viajando a uma enorme velocidade por terras e mares, andam assim, rodeando e rodeando, volteando e volteando [...]" - que andam por aí em alta velocidade distribuindo informações.

"Macbeth" foi escrita entre 1605 e 1606 e impressa no in-folio em 1623 (há exatos 390 anos) com muitas alterações. O uso do papel e suas metamorfoses ao longo de "Paper Macbeth" talvez prestem tributo a esse primeiro "Macbeth" impresso.

Na opinião do escritor inglês Gilbert Keith Chesterton, a grande lição de "Macbeth" é a seguinte: "desconfia daqueles espíritos malignos que lhe falam com tanta docilidade. Eles não são espíritos benevolentes; se fossem, provavelmente estariam mais aptos a lhe indicar um rumo". Para Macbeth, um covarde febril e egoísta e um alucinado, cuja capacidade de fantasiar é espantosa, as bruxas invocam um esquema coerente e compreensível. O esquema de fala das bruxas, se assemelha à da fofoca, que, como afirma Roland Barthes, "resume e anuncia a história futura. A fofoca é a voz da verdade [...], e essa voz é mágica: a amiga é uma fada má, que aparentando desviar, prediz e incita". Na tragédia Shakespereana, as fadas más enlouquecem Macbeth.

"Paper Macbeth" é um espetáculo que capta com sutileza, inteligência e um olhar contemporâneo o gênio do dramaturgo inglês. Vale a pena se programar!

(Crítica da Prof.ª Dirce Waltrick do Amarante, do Curso de Artes Cênicas (UFSC), no Caderno Plural do Jornal Notícias do Dia - 12/03/2013)


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